segunda-feira, junho 17, 2013

Os Escalões e as Escaladas

OS ESCALÕES E AS ESCALADAS  



 Uma reunião com estilo... antes das plaquetes!



Algumas pedras mais periclitantes foram atiradas ao vazio e um par de horas depois aterrei na varanda intermédia, na parte alta da parede, que permite escapar (ou aceder) comodamente. Uma oportuna criação da Natureza.
Na futura linha, reconhecida desde o cimo, deixei uma reunião e umas poucas plaquetes disseminadas em pontos mais expostos e difíceis de proteger.
O plano inicial era continuar por ali abaixo até à linha do mar. Mas, na plataforma, reconsiderei. Será que me apetecia manter o estilo “batota”, ao longo de toda a parede?


 A paisagem incansável desde a falésia dos Pinheirinhos.


Nos Pinheirinhos, até à data, convivem vários estilos de aberturas. As poucas vias desportivas, por definição, foram equipadas desde o cimo. Existem também algumas “clássicas” que foram semi-equipadas desde o cimo e posteriormente inauguradas mas, a maioria, foram abertas desde baixo, à vista e muitas das plaquetes foram colocadas à mão, recorrendo à energia “braçal”.
Após alguns minutos de reflexão, cheguei à conclusão que o melhor seria mesmo voltar para casa e retornar noutra altura, com a motivação para escalar a nova via desde baixo. Eticamente, indiscutivelmente, seria o caminho mais correcto.
Assim, num dia adequadamente fresco, a Daniela e eu arrumámos a “trouxa” e, lá fomos à conquista de uma nova linha.
Como noutras tantas vezes, descemos o trilho principal dos Pinheirinhos para nos posicionar por baixo da estética parede vertical do sector “Flanco esquerdo”.
Com os olhos e a imaginação traçámos um risco ao longo da falésia através do espaço aberto ainda existente entre a “Humidade relativa” e a “Quem vem aí?!”. Parecia uma linha tecnicamente exigente pois seguia por placas sem fissuras aparentes. Mais acima, avistava-se uma secção de calcário amarelo e extra-prumado, que adivinhámos complicado. Certamente um “osso duro de roer”.


 No primeiro lance da futura via.


 A iniciar o excelente segundo lance da via.


 A Daniela a sair do segundo lance de desfrute.


 O segundo lance com o mar por baixo dos pés.


Sentia-me satisfeito por não ter sucumbido à preguiça de reconhecer aquele troço de parede desde o cimo. Sendo perfeitamente honesto, considero que reconhecer, limpar e equipar desde o topo, constitui uma forma deselegante de escalada. Algo a ser relativamente menos valorizado. Se existisse uma escala de valores para o “estilo de abertura” – como as escalas que utilizamos para valorizar o grau de dificuldade – uma via reconhecida desde o cimo mereceria um valor muito inferior quando comparada com uma abertura realizada integralmente desde baixo.


 A iniciar o terceiro lance e o crux da via, uma placa intensa aberta de baixo com o apoio dos estribos. Mais tarde voltámos para a respectiva "liberação".


 No seguimento do espectacular terceiro lance da escalada, no dia da abertura.


Uma proposta para matizar o estilo adoptado aquando da preparação e primeira ascensão poderia ser, por exemplo: “Escalão A”, para vias inauguradas desde baixo “à vista” e “Escalão B”, para vias reconhecidas e equipadas desde o cimo. Seria no mínimo estranho mas, pelo menos, teríamos mais um elemento informativo acerca da história de uma escalada.
Exposto este palavreado sobre estilos perfeitos e imperfeitos devo dizer que, em algumas das aberturas nas quais participei ou realizei, adoptei o tal estilo preguiçoso de “Escalão B”. No entanto, também reconheço facilmente que me deu algum gozo suplementar escalar posteriormente essas vias, sem o stress habitual do desconhecido, dos blocos soltos e com o equipamento light e optimizado, calculado em antemão, graças às estratégias “pobres” da preparação prévia em rapel.
Na primeira intentona a Daniela e eu abrimos os dois primeiros lances da via. Passados alguns dias, retornámos para a terminar e, foi o terceiro lance que apresentou as dificuldades máximas. Utilizando a máquina e recorrendo ao artificial, ultrapassámos a secção mais dura da escalada, deixando para trás um muro compacto, equipado com o mínimo de expansivos. 


 O petate e a escaladora, no terceiro lance da via.


 O ultimo largo para relaxar e apreciar a exposição e o ambiente.

 
 A Daniela a terminar a via. "Check!"


Mais tarde retornámos, pois meti na cabeça que iria tentar forçar a nova via em livre (a Daniela dispensou o esforço e reduziu os passos de artificial com estribos a alguns puxões em A0) e lá saiu uma bonita sucessão de movimentos duros, com o crux obrigatório em travessia, protegido por um piton solitário – para dar ambiente à coisa!


Durante a repetição da via, a Daniela desfruta no ultimo lance.


Baptizámos a nova criação de “Invera”, que consiste na fusão entre as palavras Inverno e Primavera.
Nesse dia, aproveitámos ainda para sair pela nova via que esperava uma escalada, na parede superior, à esquerda das desportivas da “Cova das ovelhas”, depois da plataforma da “Varanda”, a tal com a qual comecei esta historia, a tal preparada desde o cimo… a tal de “Escalão B”.
Após algumas horas de luta, inaugurámos a "V.A.n.N." (nome de código **) que percorre um primeiro lance longo de formações grotescas e intimidativas e um segundo largo para escapar, muito menos intenso e mais curto. 


 
 Dois momentos na abertura da "V.A.n.N."


Ficam assim explanadas as considerações e reflexões relacionadas com as duas ultimas vias acrescentadas à colecção dos Pinheirinhos.
Vias de “Escalão A e B”.


Paulo Roxo


Summit again! E a respectiva foto-cume.



** "V.A.n.N.": iniciais para "Vão Apanhar nas… (!)".  


Os topos: