A Furadeira que queria nadar.

Horas antes, enquanto a Daniela se encontrava no topo do lance, num dos extremos da corda montada em “slide”, eu retirava freneticamente todo o material do interior da mochila, recentemente submersa no mar revolto do Cabo da Roca.
Já me encontrava na base da agulha de pedra, fora do alcance das ondas da maré cheia que transformara a Ursa numa ilha.
A Daniela descera-me pela corda previamente fixa na diagonal, realizando uma manobra de slide controlado. O plano consistia em fazer descer, pela mesma corda, a mochila e o restante material.
Uma cinta torcida e um mosquetão (sem segurança) aberto, enviaram ao vazio a mochila, com a câmara digital, a chave do carro e… a máquina de furar Hilti – baterias incluídas! Atónitos, observámos como todo o material entrava de chofre e, num simples segundo, nas águas frias do Atlântico. – FO…! CAR…! – gritei a plenos pulmões. Ainda calçado com os pés de gato, corri por entre os blocos e enfiei-me dentro de água para aceder a uma grande pedra e, desde aí, tentar resgatar o equipamento. A mochila lá estava, a boiar ao sabor das ondas. Conseguia avistar a Hilti a brilhar no fundo. A mochila ia e vinha, trocista, num jogo do “apanha-me se puderes”. Por sorte, a onda seguinte empurrou-a na minha direcção. Num ápice, icei também a máquina e afastei-me para terreno seco. “Lindo” – pensei. “Adeus ó Hilti!” – pensei a seguir.
Com redobrado cuidado, a Daniela desceu deslizando pela corda fixa.
Este fora o húmido culminar de uma nova aventura na Pedra da Ursa.
A máquina tinha cumprido bem a sua missão. O penúltimo lance da via resultou ser o mais duro. Na proa saliente e extra-prumada, que caracteriza a aresta esquerda da face leste, foram colocados quatro perninhos reluzentes – e resistentes – de forma a proteger uma futura repetição em escalada livre.
No lance anterior, também ficou por realizar um pequeno troço em livre. Também aí foi colocada uma plaquete, para oferecer alguma paz de espírito.
Como é evidente, os pretendentes (que serão imensos!) devem vir prevenidos com uma relativa bagagem de aceitação e paciência. É que a rocha da Ursa não está propriamente considerada como a fina flor das paredes de calcário. Falta-lhe um ou dois ISO`s europeus de qualidade… entre outras coisas, ajuda bastante uma certa crença na imortalidade.
Paulo Roxo
