Eiger Wall, a parede perdida
(muito perdida!).
Perspectiva da "Praia dos Penedos".
Dia 18 de Abril. Uma quarta-feira inócua, sem historia. Uma madrugada de Lua Nova, escura como breu.
Á medida que caminho, meio dobrado pelo peso, o frontal ilumina o curto raio de terreno que vai surgindo à frente dos meus pés.
Na mochila transporto uma corda de 60 metros, uma cordeleta de apoio de 50 metros, pitons, martelo, friends, entaladores, pernes e plaquetes, uma máquina de furar e respectiva bateria, 3 litros de água, comida e alguma roupa.
Para terminar a nova via iniciada algumas semanas antes, calculei necessitar dois dias mais. De forma a evitar carregar o material de bivaque resolvi encurtar o plano para um único dia. Então, obriguei-me a iniciar a aproximação ás cinco e meia da manhã. Esperava realizar o caminho até à base da parede em duas horas.
O sinuoso trilho de pescadores segue ao longo do mais alto precipício de Portugal continental, a falésia do Píncaro, na serra da Arrábida.
Carregando uma pesada mochila, a caminhada é dura e de altos e baixos, mas a vista é impressionante e a aérea situação tornam este percurso num dos mais belos pedestres da serra.
"Interessante" vista desde a terceira reunião!
A Escalada.
“Ok, aqui estou, mais uma vez metido num épico!”.
Já passou uma meia hora sem que me movesse um centímetro.
O calor intenso das ultimas horas deram conta dos pés-de-gato e da sola dos meus pés.
Este é o oitavo lance de escalada do dia. Estou numa placa vertical com os pés apoiados em presas “aplatadas” de aderência precária e, a uns cinco metros da ultima protecção –felizmente uma sólida plaquete. Nesse ponto encontra-se suspensa por um gancho fi-fi, a máquina de furar. Uma longa cordeleta une a máquina ao meu arnês. Esta era uma daquelas situações em que seria útil possuir quatro mãos. Está descartada a hipótese de colocar um novo perne. Diante dos meus olhos existe uma leve esperança sob a forma de uma fina fissura… demasiado fina para abrigar o friend mais pequeno e, demasiado larga para aceitar qualquer dos pitons que transporto.
“Agg! Os meus pés!” Cada vez me doem mais e a aderência escapa-se.
“Bem, espero que o meu companheiro me segure o voo.”
O meu “companheiro”, desta vez trata-se do senhor Gri-gri, fixo ao meu arnês e por onde passa a corda que desce e desce até à reunião.
Sinto que devo terminar esta via. Não me apetece nada voltar a este local em solitário. Da próxima apetece-me partilhar peso e… conversas. “Nem que seja para falar mal dos outros…”
Longos minutos se passaram e continuo agarrado na mesma posição. Pareço uma lapa.
“Tenho de tomar uma decisão!”
Não me sentindo especialmente afoito resolvo não me comprometer com o passo difícil.
Nos recônditos do meu cérebro cansado surge, finalmente, uma ideia de recurso. Retiro um entalador do conjunto e coloco-o na pequena fissura. Este não entra, fica apenas semi-suspenso. “Para grandes males, grandes remédios!”. Ergo o martelo e… “Ping! Ping! Ping!”. Umas boas marteladas esmagam o entalador na fenda. A nova protecção fixa inspira-me uma renovada confiança. Em pouco tempo resolvo o passo seguinte, em direcção à tranquilidade das protecções de qualidade.
“Ok, aqui estou, mais uma vez metido num épico!”.
Já passou uma meia hora sem que me movesse um centímetro.
O calor intenso das ultimas horas deram conta dos pés-de-gato e da sola dos meus pés.
Este é o oitavo lance de escalada do dia. Estou numa placa vertical com os pés apoiados em presas “aplatadas” de aderência precária e, a uns cinco metros da ultima protecção –felizmente uma sólida plaquete. Nesse ponto encontra-se suspensa por um gancho fi-fi, a máquina de furar. Uma longa cordeleta une a máquina ao meu arnês. Esta era uma daquelas situações em que seria útil possuir quatro mãos. Está descartada a hipótese de colocar um novo perne. Diante dos meus olhos existe uma leve esperança sob a forma de uma fina fissura… demasiado fina para abrigar o friend mais pequeno e, demasiado larga para aceitar qualquer dos pitons que transporto.
“Agg! Os meus pés!” Cada vez me doem mais e a aderência escapa-se.
“Bem, espero que o meu companheiro me segure o voo.”
O meu “companheiro”, desta vez trata-se do senhor Gri-gri, fixo ao meu arnês e por onde passa a corda que desce e desce até à reunião.
Sinto que devo terminar esta via. Não me apetece nada voltar a este local em solitário. Da próxima apetece-me partilhar peso e… conversas. “Nem que seja para falar mal dos outros…”
Longos minutos se passaram e continuo agarrado na mesma posição. Pareço uma lapa.
“Tenho de tomar uma decisão!”
Não me sentindo especialmente afoito resolvo não me comprometer com o passo difícil.
Nos recônditos do meu cérebro cansado surge, finalmente, uma ideia de recurso. Retiro um entalador do conjunto e coloco-o na pequena fissura. Este não entra, fica apenas semi-suspenso. “Para grandes males, grandes remédios!”. Ergo o martelo e… “Ping! Ping! Ping!”. Umas boas marteladas esmagam o entalador na fenda. A nova protecção fixa inspira-me uma renovada confiança. Em pouco tempo resolvo o passo seguinte, em direcção à tranquilidade das protecções de qualidade.
A terceira reunião.
A Retirada
O relógio marcava seis e meia da tarde. Passei a ultima meia hora a arrumar toda a tralha na mochila e a sacudir todas as ervinhas e pedrinhas depositadas no interior da roupa, especialmente… nas cuecas!
Estava no topo da falésia vertical e consegui terminar a via. Sentia-me satisfeito… sobretudo por abandonar de vez os malditos pés de gato!
No fundo, não tinha muitas razões para o jubilo. Ainda me faltava sair dali.
Rampas de arbustos entre cortados por franjas de calcário formavam o obstáculo entre mim e o verdadeiro cimo da falésia.
Muitos arranhões nos braços e pernas, produzidos pelo denso maquis conduziram a um dilema bicudo: “Para cima, por terreno desconhecido ou, para baixo… por terreno perigoso?”
Uma breve vista de olhos pelo relógio fez-me pensar que, ás vezes, o inexorável avançar do tempo possui um estranho poder persuasivo. A decisão foi rápida e implacável: descer!
Os últimos cinco rapeis foram realizados à luz do frontal.
No final de cada lance, ao ser puxada a corda arrastava algumas pedras que voavam em todas as direcções. Seguindo uma lógica distorcida ia pensando que, no meio da escuridão, a manobra estaria de certa forma facilitada pois era impossível ver para onde caíam as pedras. Era a “lógica da batata”, assim uma espécie de “olhos que não vêem, coração que não sente.”.
O relógio marcava seis e meia da tarde. Passei a ultima meia hora a arrumar toda a tralha na mochila e a sacudir todas as ervinhas e pedrinhas depositadas no interior da roupa, especialmente… nas cuecas!
Estava no topo da falésia vertical e consegui terminar a via. Sentia-me satisfeito… sobretudo por abandonar de vez os malditos pés de gato!
No fundo, não tinha muitas razões para o jubilo. Ainda me faltava sair dali.
Rampas de arbustos entre cortados por franjas de calcário formavam o obstáculo entre mim e o verdadeiro cimo da falésia.
Muitos arranhões nos braços e pernas, produzidos pelo denso maquis conduziram a um dilema bicudo: “Para cima, por terreno desconhecido ou, para baixo… por terreno perigoso?”
Uma breve vista de olhos pelo relógio fez-me pensar que, ás vezes, o inexorável avançar do tempo possui um estranho poder persuasivo. A decisão foi rápida e implacável: descer!
Os últimos cinco rapeis foram realizados à luz do frontal.
No final de cada lance, ao ser puxada a corda arrastava algumas pedras que voavam em todas as direcções. Seguindo uma lógica distorcida ia pensando que, no meio da escuridão, a manobra estaria de certa forma facilitada pois era impossível ver para onde caíam as pedras. Era a “lógica da batata”, assim uma espécie de “olhos que não vêem, coração que não sente.”.
Parede com cerca de 200 mts com aspecto prometedor.
O descanso
Deviam ser umas dez e meia da noite quando por fim me sentei numa grande pedra na base da parede. Finalmente podia beber e comer algo, aliviado do stress das ultimas horas.
Faltava-me o mais fácil: duas horas de caminhada a subir por terreno íngreme e irregular, carregando uma mochila que teimava em manter-se pesada e desajeitada.
Epilogo
A aventura terminou à uma e meia da manhã, vinte horas depois de ter começado.
A aventura terminou à uma e meia da manhã, vinte horas depois de ter começado.
Atenção: se me perguntarem pelo estado da rocha e eu disser que é boa... não acreditem!
Paulo Roxo
20 Comments:
Impressionante! Embora já tenha ouvido o relato "ao vivo" e até já seja possuidor do croqui e fotos da parede, fiquei uma vez mais impressionado com o tamanho desta audaciosa aventura.
Parabens!!! Só mesmo tu para tamanha escalada.
Obrigado Miguel.
Foi de facto uma aventura mas, sinceramente não sinto ter sido uma grande audácia pois, como tu bem sabes por experiência, quando escalamos em solitário, existe um momento a partir do qual deixamos de sentir as duvidas e passamos a actuar como se estivessemos encordados a um companheiro.
Agora (como também sabes), ao contrário de uma cordada normal, quando se escala uma via longa em solitário, tantas subidas e descidas (para desmontar e voltar a subir os largos) torna-se... numa real seca!
Enfim, como diz a boca do povo: quem corre por gosto não cansa.
Obrigado Ben. Ainda vamos repetir esta não?!
Paulo Roxo
Sempre o mesmo irrepetível Paulo!
Cada vez mais louco, cada vez melhor.
bjos
Teresa
Claro que vamos repetir!! Pelo menos a mim me gostaria...
hei! isso não fica no Calhau da Cova? (baia por debaixo das pedreiras) há um caminho bem mais directo de quem vai para Sesimbra pela Serra.
abraço
Fernando Silva
Sem palavras...
Nem sei como relatos destes não saiem na Abismel...
Sérgio e Natália
Parabéns por mais esta escalada.
Desta vez em solitário, actividade para mim muito difícil só por si.
Continua sempre com essa garra a fazer e divulgar as tuas vias.
Saudações Montanheiras
André Monteiro
Ganda maluko!
Sempre k aqui venho fico de boca aberta!!!
Apertem!
mais uma via aberta na reserva. Obrigado a todos....
Ora, ora... parece que temos mais um cobardolas escondido atrás de um anonimato!
Esta mensagem é especialmente dirigida ao senhor cobardolas pseudo-ecologista.
Caro senhor cobardolas, saiba o senhor que o seu carrinho que tão orgulhosamente conduz pelas estradas de Portugal prejudica muuito mais a natureza que qualquer das vias abertas por nós nessas paredes perdidas na "reserva" (de pedreiras e cimenteiras!) da Arrábida.
Saiba o senhor cobardolas que conheço e ESTIMO mais a serra da Arrábida do que você decerto algum dia chegará a conhecer e estimar.
Se por um acaso o senhor cobardolas chegasse a ler os nossos relatos chegaria á conclusão de que tentamos preocupar-nos minimamente com a preservação dos locais em que escalamos.
Queria deixar claro ao senhor cobardolas que as suas parcas palavras em tom provocatório longe de me demover da minha actividade, servirão na realidade como uma achega motivadora para continuar a abrir ainda mais vias por essas paredes fora.
Portanto, convido o senhor cobardolas a esperar sentado por novos relatos de novas vias de escalada em paredes "perdidas".
Ah! Gostaria de aproveitar a deixa para dizer que você é na verdade um hipócrita.
Para o caso de o sr. cobardolas viver numa gruta e utilizar um triciclo como meio de deslocação peço-lhe desde já as minhas desculpas. Nesse caso terei de o considerar um verdadeiro ecologista.
Um abraço de escalador.
Paulo Roxo
Sr. Anónimo
(...este nome é cada vez mais frequente! Deve estar a entrar na moda!)
Mais uma vez, alguém CONHECIDO se esconde atrás do anonimato (as maravinhas da tecnologia têm destas coisas). Mais uma vez, não serei eu a identificar quem se esconde por trás do anonimato!
Apenas vou expressar o meu mais sincero desejo:
QUE UMA ÁGUIA LHE CAGUE EM CIMA!
Ficaria feliz por duas razões
1º porque seria bom que estas ainda povoassem as falésias da Arrábida
2º porque esta seria seguramente inteligente para...cagar em si (tal como muitos de nós)!
Melhores cumprimentos
Daniela
Caros colegas, como leram não me dirigi ás vossas pessoas com maus tratos.Hipócrita não sou e muito menos cobardolas. Quanto a águias cagarem-me em cima, devo ilucidar á dona Daniela q as mesmas estam em vias de extinção na costa da Arrábida e q se uma dela cagasse em cima de mim, considerar-me-ia um preveligiado. É fantástico o efeito sociológico q o anonimato faz, não é? Bem mas por ver cada vez mais vias abertas, escaladores e afins ( e não estou a dizer mal pq tb sou ), tenho reparado que quer o Bufo Real quer o Falcão Peregrino andam a mudar de hábitos. Mas como os Srs. é q são os entendidos na matéria, eu não sei do que falo. Continuem o vosso trabalho mas não faltem ao respeito ás pessoas que (pensam) que não conheçem.
Cobardolas!
Ainda há águias nas falésias da Arrábida?
Ora cá está uma alegre novidade! Isso sim, são boas noticias, é sinal que estão a voltar!!!
De uma coisa estamos seguros, não habitam nem na falésia dos Pinheirinhos nem nesta "nova" parede e não é devido à presença de escaladores, pois quando descobrimos estes locais (há pouco tempo), já elas tinham zarpado para outras paragens. Será que o "vrum vrum" dos barcos que constantemente passam por ali, a cerca de 50m de distância das paredes têm alguma influência?
Será que os rebentamentos nas pedreiras têm alguma influência?
Pois de facto é escalador, mas de momento pouco assiduo!
Daniela
PS: as novas tecnologias são como o algodão...não enganam!
Meu querido amigo, companheiro, compincha... mmm... Diogo?!... André?!... Luis?!... Manel?!... Baltazar?!... Luisa?!... Sofia?!... Gumerzinda?!... Policarpo Ambrósio da Silva Aurora?!...
Quem é que tão vilmente ofendemos?
Quanto a mim apenas respondemos a uma curta, hipocrita e (porque não) acobardada mensagem provocativa anónima de alguém que ao mesmo tempo aparentemente não é ninguém.
Portanto, porque não fazer chacota de uma frase perdida e sem dono?
Se assinares e não mandares bocas ao ar, então terás o nosso maior respeito. Mesmo que não concordemos.
Como é evidente és livre de lançar as bocas foleiras que te apetecer mas então não esperes que a malta venha com paninhos quentes. Talvez venhas a ler aquilo que não queres... azar!
Para este ultimo caso o único ( e ultimo) que terei a dizer-te é: vai mas é chatear quem realmente está a destruir os nossos territórios naturais e deixa lá em paz quem está realmente (minimamente e na medida do possivel) interessado em manter as serras intactas (é que pelos vistos nunca aprendeste que para se proteger é necessário conhecer).
Paulo Roxo (vês?! Não custa nada assinar).
È mta bem granda Roxo! parabéns pelo empreendimento em solitário, nunca aqui o disse mas tenho que dizer todas as vias tuas que repeti são excelentes, este teu relato que deixaste pôs-nos em pulgas para emergimos mais uma vez numa grande aventura, continua assim e obrigado pelas vias que abres e permitem a mta gente q não possui tal audácia de disfrutar de adrenalíticas escaladas, e ao contrário do q mta gente pensa, qd um gajo está à rasca e onde não há fissura nem buraco onde se meta algo decente lá está um reluzente pernezinho a sorrir. obrigado e um bem haja! B.monteiro
Barcos, carros, lixo...mas a culpa é sempre o mauzão do escalador...oh pá pelo menos que seja do governo, já me parece moda andar a implicar com os escaladores e dizer que as galinhas se vão embora das falésias por causa de nós...
Tem santa paciência.
Esperamos mais relatos destes e NOVAS VIAS FANTÁSTICAS...
Desculpem ter-me metido na conversa mas estas coisas revoltam-me.
Abraço
Ainda não tinha tido a oportunidade de agradecer as palavras de apoio. Muito obrigado.
Queria também referir que as vias abertas foram (e serão sempre) um trabalho de cordada, salvo (evidentemente) as que pontualmente são realizadas em solitário -nos dias positivos em que todas as estrelas estão alinhadas.
Assim, gostaria de estender estes cumprimentos aos meus companheiros de escaladas e bloguinho.
Beijos e abraços.
Paulo Roxo
(e cuidado com os passarinhos... desculpem, não resisti...)
Descobri o teu blog por acaso, embora através de uma pesquisa no google tenha encontrado o teu nome.
Muito bom, espero que continues a conseguir uma forma das pessoas disfrutarem do pouco de natureza que ainda existe.
O anonimo, precisa de dar uma espreitadela a mais ou menos a 7km de onde abriste essa via, para que tenha consciencia do que fala.
Eu vivi em setubal durante 25 anos e conheço bem essa zona, não é de certeza por pessoas que gostam de desporto e natureza, que as especies em vias de extinção não se fixam na àrea. As razões são várias e provalmente essa não consta de uma lista tão extensa. Talvez se existir mais gente, servindo-se de meios de tecnologia tão convenientes, a conseguir divulgar a beleza de um sitio através de uma actividade saudável e inofensiva as coisas tenderiam a mudar. Nos meus anos que conheço a serra, onde encontrei menos lixo e vestigios de actividade humana, além das veredas provenientes das caminhas, foi justamente nos locais onde há vias.
Amigo também somos animais, porque é que não podemos partilhar o mesmo espaço?
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