PIRINÉUS - RESPIRAR!
Acto III - SEGUINDO MARIOLAS
As maiores flores Edelweiss que já vimos.
O planeamento foi feito ainda no rescaldo da aventura vivida na parede da Fraucata.
“Vai ser duro!” - advertiu a Daniela - “Mas será um novo
desafio!” - rematou.
O plano consistia em abrir uma nova via na já familiar
parede do Abismo de Carriata mas, desta vez, durante uma única jornada. Apenas
iriamos transportar duas pequenas mochilas e as cordas duplas. Nada de cordas
fixas, nem lances escalados preliminarmente. Era um plano muito simples: aproximação,
escalar cerca de 300 metros de rocha periclitante e descida contornando e
destrepando a muralha de calcário.
Abismo de Carriata. Uma parede já conhecida com aventuras solitárias para oferecer.
Durante dois dias descansámos o físico - quanto a mim, o
foco estava na recuperação dos tornozelos - e preparámos o psicológico.
Às seis e meia da manhã, à luz dos frontais, subíamos o
trilho irregular e empinado em direcção à parede mais emblemática de Ordesa, o
Tozal del Mallo. Acompanhava-nos de perto um casal de escaladores que
(adivinhámos) se dirigiam para o Tozal. Quando se sai do bosque denso os
caminhos dividem-se e é nesse momento que se dá de caras com o Abismo de
Carriata. O nome é curioso e sugestivo, adequado. “Abismo, aí vamos nós!”
Depois da “paliza” da escalada anterior, sonhávamos com uma
via mais amena. Sonhávamos com uma escalada fluída e de dificuldade técnica,
digamos… mais “atractiva”!
“Onde param os quintos graus nesta terra?” – perguntámo-nos
na galhofa.
"Onde param os quintos?"
Longe de encontrarmos uma “via amena”, o que descobrimos foi
uma escalada exigente. Em cada reunião do itinerário, de pescoços assomados para
trás, perscrutávamos o futuro acima das nossas cabeças. A cada: “Creio que se
formos por ali, talvez as dificuldades sejam menores.”, sucediam-se os
inevitáveis: “Fo… isto é duro! Isto não se parece nada com o que imaginámos!” Apenas
de cima para baixo era possível compreender a verticalidade do mundo em que
estávamos metidos.
Escalando lego...
Praticamente toda a via desenrolava-se sobre grandes lastras
de calcário que se projectavam para fora, causando uma perturbadora sensação de
poiso de pássaro. Pessoalmente, desfrutava a cada descanso, porque este
representava uma vitória mais e a possibilidade de usufruir de umas visões muito
aéreas das florestas que se perdiam lá bem no fundo do vale.
No penúltimo lance, o mais duro.
Apesar das dificuldades encontradas o dia correu bem,
bastante bem até.
Atingimos o cimo da nossa via com bastante tempo para
realizar a descida com tranquilidade.
Sentados nos prados superiores do vale, já sem a prisão dos
arneses e do equipamento de escalada, a uma razoável distância de segurança do precipício
por baixo dos pés, pudemos apreciar as vistas esplendorosas.
Prestes a entrar numa penosa chaminé estranguladora.
"Reunião. Uffff!"
Futuro!
Desde aquele
ponto, a parede sul do Tozal del Mallo, com cerca de 400 metros, apresentava-se
de perfil, mesmo assim, constituía uma visão magnífica difícil de ignorar.
Descemos em modo de passeio, inebriados pelas montanhas, sem
desperdiçar os momentos de contemplação. Virando a cabeça para trás surgiam de
novo as paredes e com elas surgiam também novas ideias, novos projectos. “Em
breve…” Mas isso seria para depois. O momento era para descer em direcção ao
descanso.
Zigue-zagueando o trilho sinuoso, saltitando os ressaltes e
as inúmeras pedras, trocámos poucas palavras. Em silêncio celebrámos as andanças
verticais. Celebrámos a aventura. Celebrámos a vida.
Para trás ficava o território selvagem das montanhas… à
nossa frente surgia de novo aquela sensação de…
… saudade.
Paulo Roxo
PIRINÉUS - RESPIRAR!
FIM
FIM
Topo da via MARIOLAS:
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