(Nota: Continuando na recuperação de textos já escritos anteriormente e aparecidos em alguma página ou forum da web, aqui fica mais um breve relato)
O voo do Mandarim
O voo do Mandarim
Pirilú, pirilú! O despertador soava assim à hora a que nos propusemos deixar o conforto dos lençóis, mas só uma boa meia hora depois é que fomos atacados pela vontade de deixar o leito.
Começava assim uma das minhas mais...vergonhosas aventuras.
O céu mostrava-se azul, o dia parecia perfeito (atenção...só parecia!!!), e...tal como no Domingo passado, éramos três, eu, o Paulo Roxo e o Miguel Grillo.
Tal como no Domingo passado, dirigimo-nos confiantes para mais uma parede no Cabo da Roca, até então apenas assediada por pescadores (ainda agora me pergunto se lá vão pescar...ou escalar, pois o acesso...ui ui!).
A via que nos esperava, localizada num promontório entre a baía da Assentiz e o Cabo da Roca, apresentava características...pouco comuns para o que estou habituada, dois largos em travessia mesmo por cima do azul do oceano, para conquistar uma lindíssima e verticalíssima parede (e o que ansiei por essa parede!).
Chegado o momento de me equipar, uma suave escorregadela no burgau da praia (aqueles redondos calhaus, tão típicos das praias daquela redondeza) avisava-me que o dia não ia ser fácil. O meu cérebro, ainda meio adormecido balbuciava “Rocha podre até tolero e confesso que até chego a gostar um bocadinho, agora travessias...sempre fui devoto da...verticalidade na escalada!”.
Começava assim uma das minhas mais...vergonhosas aventuras.
O céu mostrava-se azul, o dia parecia perfeito (atenção...só parecia!!!), e...tal como no Domingo passado, éramos três, eu, o Paulo Roxo e o Miguel Grillo.
Tal como no Domingo passado, dirigimo-nos confiantes para mais uma parede no Cabo da Roca, até então apenas assediada por pescadores (ainda agora me pergunto se lá vão pescar...ou escalar, pois o acesso...ui ui!).
A via que nos esperava, localizada num promontório entre a baía da Assentiz e o Cabo da Roca, apresentava características...pouco comuns para o que estou habituada, dois largos em travessia mesmo por cima do azul do oceano, para conquistar uma lindíssima e verticalíssima parede (e o que ansiei por essa parede!).
Chegado o momento de me equipar, uma suave escorregadela no burgau da praia (aqueles redondos calhaus, tão típicos das praias daquela redondeza) avisava-me que o dia não ia ser fácil. O meu cérebro, ainda meio adormecido balbuciava “Rocha podre até tolero e confesso que até chego a gostar um bocadinho, agora travessias...sempre fui devoto da...verticalidade na escalada!”.

Após a abertura do largo pelo Paulo (um simpático 6a), como segunda de cordada, lá me fiz à travessia. De inicio, a coisa parecia não correr mal, até que...surgiu no dito primeiro largo horizontal um pequeno nicho, uma (in)contornável reentrância na belíssima parede de granito. O tico e o teco (os meus 2 saudáveis neurónios!) deixaram subitamente de funcionar e foi nesse preciso momento, que o meu corpo se recusou a continuar aquela ingrata travessia. Gritei “vooouuuuu voooltaaar para tráááásss!”, prevendo já que o dia não me iria correr de feição, “dá muuuuuu!”. A resposta do Paulo e do Miguel foram concordantes...mas discordantes do que EU, na altura esperava ouvir “O quê? Não vais nada embora, agora vens até ao fim!“. O tico e o teco, depreendo eu ainda meio adormecidos, voltaram a atraiçoar-me. Para não me separar do dito corrimão, em vez de me agarrar ferozmente ao granito tentando contornar o nicho...agarrei-me à corda (erro crasso)! Assim sendo, o maciço rochoso só poderia ser novamente alcançado no final do dito nicho. Pendurada...que nem um cacho de uvas, com o mar trocista por baixo dos pés (e totalmente desmoralizada!), lá puxei pela corda tentando minimizar o tempo despendido (não digam a ninguém, mas pela primeira vez vi-me forçada a recorrer ao meu Tbloc!). Na segurança que se seguiu, o estribo do Miguel deu também uma preciosa ajuda (preciosa e desmoralizante!). O alivio apenas senti quando a minha auto segurança se enganchou na reunião. Mas...seguia-se ainda um outro largo em travessia. A minha confiança...qual confiança??
Verdade seja dita, o segundo largo apresentou-se bastante mais fácil (um Vº), mas para mim naquela altura, tudo me parecia difícil. Chegada à segunda reunião, apenas uma ideia me assaltava o pensar “Daniela, tu não tens jeito nenhum para isto!!”.


Como terceira de cordada, lá iniciei o largo, um pouco incerta se o melhor seria escalar...ou tentar nadar até ao burgau da praia (sempre achei que nado melhor do que escalo!), mas a tumultuosa maré forçou-me a continuar. Com a confiança muitíssimo abalada, iniciei o terceiro largo e a coisa até começou a correr bem. O ambiente era fantástico, céu azul, mar revolto e a fissura...aquela fissura não poderia ser melhor desenhada pela natureza para escalar. A abertura certa para os meus dedos, a rugosidade ideal para a minha pele, fez-me acreditar que a minha sorte estava definitivamente a mudar. “F.....”, gritei, acrescentando de imediato uma série de palavras de igual calibre, tinha deixado cair o Alien amarelo do Miguel. Lá em baixo, o dito friend repousava numa plataforma de rocha e eu ali, a olhar para ele a cerca de 20 m de distância (como o perto pode ser tão longe!). Rapidamente gritei “Desceeee-me, está ali na rooooocha” (nessa altura convenci-me que a sorte estava do meu lado) e como resposta ouvi o Paulo “Agora já não está!”. O mar ria-se de mim, lá em baixo e de uma dentada, engoliu o precioso aparelhinho!


Que mais me irá acontecer, continuei a pensar receando assim ainda mais, o largito que faltava.
Quarto largo, lá o iniciei com um passito de artificial (que poderá eventualmente fazer-se em livre para os corpos mais musculosos) ao que se seguiu mais uma bela fissura, desta, mais dura que a anterior (6b), mas fazível! Foi reconfortante atingir o cocuruto do promontório onde nos encontrávamos.
Assim, no dia do meu mais vergonhoso momento de escalada, surgiu uma das mais belas vias do Cabo da Roca, o “Voo do Mandarim” (o “voo do friend” ainda hoje me parece o nome que seria mais adequado!!), com uma das mais bonitas e perfeitas fissuras (verdade seja dita que não me recordo de outra melhor) que até hoje me passaram pelos dedos. Perfeita, foi também a companhia do Paulo e do Miguel.
Na minha mais pessoal opinião, diria que para uma parede perfeita num ambiente perfeito, é essencial a companhia perfeita e estes dois souberam seguramente sê-lo!
Após mais de 24h sobre a via, criou-se-me a ânsia de a repetir, e seguindo o exemplo das lapas, agarrando-me da próxima SEMPRE ao granito...
“Rocha podre até tolero e confesso que até chego a gostar um bocadinho, agora travessias...sempre fui devoto da...verticalidade na escalada!”...mas pela beleza, o meu cérebro confessa-vos que aquela travessia até vale a pena fazer...
Daniela Teixeira
12/04/2005
Via «O voo do mandarim» (125 mts, 6b/A1)
Placa do Sol - Baía de Assentiz - Cabo da Roca
(Aberta por Daniela Teixeira, Paulo Roxo e Miguel Grillo em Abril de 2005)

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: )
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