sexta-feira, setembro 01, 2006

NUMÃO na mão!

A primeira vez que procurei a Fraga de numão não a consegui encontrar. Já lá vão bastantes anos mas, eu já estava algo acostumado a procurar paredes ignoradas. No entanto, a Numão não a avistei.
Quem não conhece o local, pelo que digo pode pensar que esta fraga se encontra refundida num vale encaixado e inacessível ou, a uma distância descomunal... mas não! A Fraga de Numão ergue-se altiva e orgulhosa, ás vistas de toda a gente num dos montes mais altos da Serra da Peneda, na região de Castro Laboreiro. De facto, não encontrar esta torre é realmente uma proeza apenas ao alcance de um distraído incorrigível.
Um belo dia, quando finalmente a descobri, a sua majestosidade e morfologia estranha cativaram-me por completo.
Durante meses sonhei em escalar este magnifico monolito. Abrir por ali uma via tornara-se numa espécie de obssessão.
Mais tarde tive a minha oportunidade. Acompanhado por um escalador da Alemanha de leste, Bidji (em férias no nosso país) lá partimos à aventura.
Uma tempestade repentina gorou a tentativa. A fuga em rapel, à beira da hipotermia, a um lance do final, resultou no desfecho desta incursão. Ficou prometido o retorno para terminar a via.
Pouco tempo depois, também o Miguel Grillo e o João Ferreira (“Animado”) fizeram uma tentativa à Numão.
A sua linha, mais audaciosa, visava uma parede de fissuras no flanco esquerdo da torre, conduzindo a um extra-prumo pronunciado.
Também esta investida não obteve o resultado desejado. Uma grande placa demasiado lisa (e demasiado musgosa) impediu-os de continuar. Desta feita, também ficou prometido o regresso.
Antes destas cordadas, a Fraga de Numão já tinha sido visitada por escaladores. Entusiastas do outro lado da fronteira, acostumados ás fissuras e placas da vizinha Meadinha, abriram uma via que cruza mais ou menos o centro da parede.
Esta via Galega era a única “conhecida” da Numão. Infelizmente, está semi-soterrada pelo musgo e a sua linha exacta roça o limbo do esquecimento.
Em jeito de salvação e, no meio destas histórias de fracassos e inundações de musgo, eis que surge uma via “realizável” nesta bela fraga.
Mês de Junho de 1998.
Vitor Viana e João Dinis divisam uma possibilidade no lado direito da parede.
A linha escolhida parecia apresentar um grau de “musgosidade” aceitável. O facto constítuia uma nova fonte de motivação.
Na verdade, a “Marca do Pastor” representa um verdadeiro golpe de mestre.
Uma observação sagaz e cuidadosa permitiu aos seus autores interligar uma série de fissuras e diedros de tal modo que, para a concretização deste itinerário com 120 metros apenas foram colocados três spits, em reuniões.
A utilização da escova foi espartana. Apenas foram limpos os pontos exactos para a colocação dos pés. Esses pontos ainda podem ser observados (e utilizados!) hoje em dia, oito anos após esta aventura.
A Daniela Teixeira e eu resolvemos repetir a via.
Secretamente, levava na esperança realizar o ultimo largo em livre, uma vez que o croquis dizia A1.
No segundo lance a coisa arrebita pois os passos são técnicos e a fissura existente é demasiado larga. A colocação de um camalot nº4 traz alguma paz de espirito. Sem o camalot nº4, bem... digamos que a emoção está garantida!
Com a elegância de um paquiderme (bêbedo) lá saquei em livre o ultimo lance.
A Daniela testemunhou divertida os meus grotescos esforços, sempre sonorizados com grunhidos incompreensíveis.
Este é um largo de fissura (muito larga) diagonal, na qual um tipo têm de se entalar de forma a proteger e... aproveitando o entalamento... reptar... em livre! Soa bem, não? Felizmente existe a opção mais confortável dos estribos.
Escoriações aparte, lá chegámos ao cimo da Fraga de Numão.
A vista desde aqui é simplesmente magnifica. No entanto, para estragar o ambiente e, para nos relembrar de como é um típico Verão Português, também avistamos ao longe a coluna de fumo de um incêndio de grandes proporções.
Quanto à via, sinceramente, de se lhe tirar o chapéu!

No ar ficou a ideia de retornar para escovar toda a via e reequipar as reuniões (os spits já começam a ter um aspecto arcaico!).

Paulo Roxo

(fotos nos 2 posts anteriores)

4 Comments:

Anónimo said...

FANTÁSTICO!!!
Será que estas disposto a ser clonado? É que com 3 ou 4 iguais a ti, havia uma revolução neste cantinho à beira-mar plantado.
Parabéns e muito obrigado pela divulgação.
Alex.R.

Anónimo said...

A Daniela, observou de facto o "paquiderme" a sacar o tal larguito em livre e bem divertida! Mais ainda porque tal, foi sempre acompanhado com musiquinhas da festarola que decorria ali por perto e essas rezavam assim:

"...e se elas querem um abraço ou um beijinho, nós pimba...trálálá..."

No auge desta festaça, algo coincidente com uma total arrastamento do "bicho" ouvia-se em alto e bom som:

"Estava a assar sardinhas, com o lume a arder
Queimei a pilinha, sem ninguém saber
se fosse outra coisa, eu não me importava,
mas era a pilinha, o que mais gostava!
...trálálá..."

...coitados dos passarinho, com tanta azáfama creio que foram piar para outras paragens!

Daniela

Anónimo said...

Olá Paulo,
Eu e o Emílio tentámos repetir a via galega em 1981 ou 1982 o que não foi possível pois passámos uma semana na base do penedo com chuva torrencial todos os dias. Nunca mais voltei lá. Tenho o croqui original que na altura fomos buscar à Sualonso.

António

Anónimo said...

Olá Antonio.
O Miguel Grillo também tem esse croquis.
Infelizmente a via aparenta estar um tanto ou quanto irrealizável.
No entanto, nada como experimentar...
Um dia destes...

Obrigado e um Abraço

Paulo Roxo