quarta-feira, janeiro 30, 2008

A Parede Amarela



Nem mesmo em Portugal é fácil reclamar a primeira ascensão de uma determinada parede.

Para a população geral a importância de uma primeira ascensão é relativa, é um acontecimento de certa forma inócuo.

Mas, para quem gosta de um tipo de escalada mais voltada para a exploração, a “primeira” tem sempre um gosto especial. Trata-se da descoberta do desconhecido, do “como será?”. É a aventura de tocar o nunca antes tocado, a surpresa de descobrir a presa escondida (e de verificar que afinal não é assim tão boa!), o risco do compromisso, no fundo, a certeza de que tudo é incerto.




Como num quadro, a abertura de uma via de escalada surge fruto da inspiração. São pinceladas suaves e lentas que desenham a tal linha invisível que de uma forma surreal logra unir formações rochosas características, revelando a anatomia das pedras e expondo uma vida onde outrora apenas existia um elemento sem alma.




Há algumas semanas à Daniela Teixeira e a mim foi-nos oferecida a possibilidade de pintar um desses quadros de arte abstracta e, ao mesmo tempo, minimalista, numa tela de rocha que ainda não tinha conhecido a paleta.




A “Bio-(H)azar(d)” foi pincelada em dois dias (separados por uma semana) e inaugura um sector inteiro, na zona dos “Pinheirinhos”, baptizado com o nome de “Parede amarela”.





Trata-se de uma via com cerca de 80 metros, em que o primeiro lance ultrapassa o diedro mais evidente da parede, imediatamente visível durante a aproximação, com o grau a rondar o 6c e onde será necessária alguma atenção devido ás pedras.

O segundo lance, mais curto, é na verdade uma trepada diagonal com um curto passo de quinto.

O terceiro e ultimo largo é o mais difícil e foi aberto em artificial, tendo sido deixadas cinco plaquetes intercaladas com os inevitáveis entaladores e friends, de forma a permitir a realização em livre.

Na passada quinta-feira, voltámos o João Gaspar e eu para dar um “tiro em livre” à “Bio...”.




A coisa saiu bastante dura e as protecções, embora “à bomba” (testado!), revelaram-se de colocação algo esgotante.

O João fez melhor figura que eu e lá decifrou a saída do extra-prumo e o termo das dificuldades.

Pensamos que o numero rondará o 7 e a proposta fica em 7b, ainda por encadear.

Pretendentes?

Paulo Roxo






terça-feira, janeiro 22, 2008

Venham daí os resíduos! Mais resíduos, muitos resíduos!

(Sempre sonhei em ter uma casa num parque natural...com vista para o mar)

"A Secil retomou sexta-feira a queima de resíduos perigosos na cimenteira da Arrábida, uma operação permitida pela decisão do Supremo Tribunal Administrativo, disse à agência Lusa fonte da cimenteira.

«A unidade esteve parada quase um ano. A queima que efectuámos na sexta-feira serviu para testar se estava tudo a funcionar normalmente. E estava. Esta semana vamos retomar a queima diária, estamos só à espera que cheguem os resíduos» para co-incinerar, afirmou Nuno Maia, porta-voz da Secil."

Pois, porque pelo que hoje ouvi na TSF, os resíduos que estavam em lista de espera já foram todos esturricados! Agora espera-se que chegem mais, algo como 12 pequenotes camiões extra repletos de residuos perigosos a passearem por ali...coisa pouca!

(Quando eu for grande quero ter um camião assim!)

Esturriquem mas é o Supremo Tribunal Admnistrativo e os administradores da Secil! Quem vota a favor da co-incineração destes...destes bandalhos?



quarta-feira, janeiro 16, 2008

Parque Natural da Arrábida

Aí é??? Onde fica??
Como diz o Sérgio Godinho "Só neste paíííííííís..."


Declarações do administrador da Secil
Co-incineração no Outão pode arrancar "dentro de dias"
16.01.2008 - 13h01 Ricardo Garcia
O processo de co-incineração de resíduos na cimenteira do Outão, na Arrábida poderá ser retomada dentro de apenas alguns dias, disse hoje ao PÚBLICO Carlos Abreu, administrador da Secil. O Supremo Tribunal Administrativo deu luz verde à co-incineração naquela cimenteira, tal como já tinha acontecido em Novembro com o caso de Souselas.

Esta decisão, conhecida pela cimenteira e pelo Ministério do Ambiente na passada segunda-feira, contraria as decisões tomadas por dois tribunais de instância que tinham suspendido a queima de resíduos perigoso na cimenteira do Outão.

A decisão do Supremo surge em resposta ao recurso da Secil e do Ministério do Ambiente da decisão do Tribunal Administrativo do Sul que confirmou a sentença do Tribunal Fiscal e Administrativo de Almada no sentido de suspender a co-incineração.

"Estamos a pensar retomar [a co-incineração] brevemente, É uma questão de três a quatro dias", disse esta manhã Carlos Abreu.

Esta manhã, o advogado representante das populações de Palmela, Setúbal e Sesimbra afirmou parecer estranho que o juiz relator do acordão sobre Souselas assine agora também o acordão do SAT sobre o Outão. E a Quercus classificou de "estranhíssimo" este acordão.

domingo, janeiro 13, 2008

O Dentinho do Gatinho


Para todos aqueles que anseiam por um soleado dia de “escalade plaisir” num local bonito e isolado, junto a um convidativo mar de profundo azul turquesa, aqui fica uma proposta irrecusável.

O João Gaspar e os seus compinchas, nas pessoas de Teresa Leal, Miguel Loureiro e Mário “das Arábias”, dirigiram-se aos “Pinheirinhos” para equipar algumas vias no primo pequenino do “Dente do Leão” (este, em Sesimbra), já conhecido como “Dentinho do Gatinho”. Trata-se de uma pequena torre de calcário que se destaca das grandes paredes contíguas.


O “Dentinho do Gatinho” foi conquistado pelo próprio João Gaspar e pela Teresa, recorrendo a material volante, através de uma espécie fissura virada ao mar (“Atirei o pau ao gato”). Nesta “F.A.” não foram deixadas quaisquer plaquetes e a descida foi realizada ao bom estilo bávaro, em que o ultimo de cordada desce em rapel assegurado pelo companheiro situado no solo, no lado oposto da torre.

As novas vias encontram-se integralmente equipadas com material inox e os graus variam entre o “6 há mais e o 6 sê mais”.

Uma actividade completa poderá ser, combinar a escalada destas vias com a “Pilar Desencantado” (necessária corda auxiliar para rapel) mesmo ao lado, com três lances e também equipada.

No entanto, o “Dentinho do Gatinho” constitui um fim em si, permitindo à maltinha saborear a rara sensação de conquistar um verdadeiro cume, mesmo que de uma pequenina micro-montanha de calcário!

Agora, já existe a opção de empreender de uma forma tranquila, o bonito trilho costeiro que conduz à base dos “Pinheirinhos”, transportando apenas um conjuntinho ultra-light de expresses.

Com um pouco de sorte ainda pode ser que levem para casa a visão sempre espectacular e única dos golfinhos (ruazes) que, de quando em vez e ao fim da tarde, cruzam a costa da região, em direcção ao oceano.

Paulo Roxo

Os croquis do joão Gaspar:





terça-feira, janeiro 01, 2008

Conto de Natal

Como a época de neve passada foi escassa, nos princípios da primavera enviei um mail ao Pai Natal. Prometi-lhe que me portaria bem o ano inteiro e pedi-lhe que desta enviasse neve e frio, para saciar a minha vontade de fazer actividades de inverno.

Um pouco antes do Natal, numa noite de sono profundo, sonhei que nevava na nossa serrinha e que encordada ao Pai Natal, abríamos uma imensa cascata de gelo. Ao perceber o sinal, logo de manhã mergulhei na web, rebuscando todas as páginas que me pudessem informar sobre as condições meteorológicas da Estrela. A webcam da Turistrela, que se encontrava desligada até à data (não sei bem porque, mas fiquei com a ideia de que queriam enganar a malta ao substituir as imagens em directo, por uma foto nevada!) funcionava novamente, era bom presságio. Nos diversos sites que consultei, as indicações eram de neve e frio, os astros pareciam conjugar-se, tudo indicava que o Pai Natal estava atento. Eu portei-me bem, ele, mandou-me um presente.

Sexta-feira, depois do tradicional treino ao fim do dia, eu e o Paulo montamos as renas...perdão, o Megane, e aceleramos em direcção a uma das mais grandiosas cadeias montanhosas do planeta (com a Serra da Estrela aqui ao lado, quem é que quer saber dos Himalaias?).

Já no maciço central, os cristais de gelo que a lua fazia cintilar, preencheram-nos o olhar. A brancura da neve brilhava perante os faróis das renas...perdão, do Megane! “Paulinho, acho que vamos abrir a época este fim-de-semana” e dois enormes sorrisos se esboçaram perante tamanha certeza.

Nessa noite, adormecemos felizes desejando que as horas passassem fugazes e que a manhã nos despertasse com alguns graus abaixo de 0.

Finalmente o despertador “Cucu toing, cucu toing”. Os nossos corpos ansiosos, rapidamente se enfiaram nas típicas vestes de Inverno e entre os Gore-Tex, piolets e restante material, breve iniciamos a descida para a algo branca face norte do Cântaro Magro. Não falei nos crampons propositadamente, pois a neve estava tão mole que não foram necessários. Passado algum tempo, vislumbramos uma linha de aspecto relativamente fácil, que achamos apetitosa para começar.

Concordamos que deveríamos abrir a época com algo simples, apenas o suficiente para tirar a ferrugem. Enfiamos as botas nos crampons e lá fomos nós por ali acima, entre gancheios e tentativas frustadas de cravar o piolet numa neve que se revelou...execrável!

Rapidamente tivemos de admitir que estávamos mais do que aquecidos! A linha que parecia fácil, com aquela neve totalmente desaconselhada para qualquer tipo de actividade, revelava-se um verdadeiro desafio aos nossos recursos físicos...e mentais!

Quando atingimos o anel do Cântaro fomos invadidos por um típico sentimento natalício. A felicidade! Sentíamo-nos felizes por ter aberto a primeira via mista da época e mais ainda por termos constatado que é possível fazer actividades sejam quais forem as condições...recorrendo claro está a uma enorme vontade e aos apelos da imaginação! Com pouca imaginação, apelidamos a via de “O Reino das Oposições”.

Depois de uma pequeno repasto aquecido pelo sol no anel do Cântaro, achamos por bem reconhecer uma nova zona, com esperança de encontrar melhores condições para o dia seguinte. Movidos pela curiosidade, fomos espreitar um cantinho entre a famosa estatueta da Santa e o Cântaro Raso. Tínhamos vislumbrado as paredes brancas ao longe, quando subíamos pela estrada que vem de Manteigas.

Após uma pequenita caminhada...WOW! Uma fantástica parede coberta de escamas de gelo, com graciosas fissuras preenchidas de branco e musgo que parecia encontrar-se em excelentes condições para receber os bicos dos nossos famintos piolets.

“Tantas vias mistas! E de alta dificuldade! Tantas fissuras! E bem vertical! Grande potencial...” exclamou o Paulo. Comecei a sentir-lhe aquela ansiedade que resulta da abundância. Os seus olhos arregalados perdiam-se por entre as fissuras, como quem as quer escalar todas de uma assentada e não sabe onde começar (imaginem uma criança gulosa com 5 deliciosos chupa-chupas que não cabem na boca todos de uma vez!).

“Granda sector!” acrescentou com um sorriso esbugalhado. “Que nome é que damos a isto? É altamente escocês!”. Por uma questão de lógica, achamos por bem baptiza-lo de “POWER MIX”.

Na manhã seguinte estávamos lá plantados para o desfrutar. Novamente topamos uma linha de aquecimento. Resultado?

Aquecemos e muito!

Aquecemos os pés, joelhos, coxas, cotovelos, barriga e peito, ombros...pelo que chamamos à via “Reptovia”, recorrendo novamente à lógica. É que pelo meio, para além de um “reptanço” numa chaminé (daquelas que a malta gosta de escalar e gosta ainda mais quando está emaranhado nos piolets e crampons), tivemos direito a uma passagem por debaixo de um calhau...verdadeiramente elegante!

Ainda com algumas horas por preencher, topamos outro alinhamento verdadeiramente interessante, este com aspecto um pouco mais duro, mais vertical. Depois dos dois primeiros enganos, achamos por bem conter a gula e não nos atirarmos às de aspecto mais poderoso, mais ainda porque com segurança, só contávamos com os gancheios na rocha, única coisa que era definitivamente estática (pois, nem o musgo estava nas melhores condições!...apesar de ainda assim ser bastante mais seguro do que a neve!!!).

O aspecto “um pouco mais duro” confirmou-se em pleno. Resultado? 110m repartidos por 3 largos que se prolongaram até à luz do dia nos abandonar. Mais uma vez, para além de perdermos todo o amor ao material (não imaginam em que estado ficaram os Gore-tex!...e o quão arredondadas ficaram as pontas dos piolets e crampons de tanta coquinada!) e recorrermos a todos os truques da nossa imaginação para fazer certos passos (e claro, usando toda e qualquer parte do corpo para superar certas passagens), lá conseguimos atingir o topo da parede, felizes por o fim-de-semana nos ter rendido 3 fantásticas vias de misto. Novamente recorrendo à lógica, apelidamos a ultima via de “Anatomia da tracção”.

Obrigada Pai Natal! Não, não estou chateada com a neve de merda com que nos presenteaste no fim-de-semana, quero é agradecer-te por nos mostrares que com vontade e imaginação, tudo é possível.

Daniela Teixeira